Alguns gargalos tornam a produção agroecológica e orgânica mais difíceis, entre elas a questão oferta x demanda. No entanto, existem estratégias para contornar o problema e obter lucros satisfatórios.
Quem trabalha com modelos de agricultura natural, como o agroecológico e o orgânico, é essencialmente alguém com consciência ambiental aflorada. Somos apaixonados pela terra...
No entanto, no momento de "viver disso", é preciso ser pragmático com relação as regras da economia de mercado.
1 - No Brasil as modalidades de agricultura natural não conseguem subsídios com facilidade. Uma das razões para isso é que os empréstimos e financiamentos disponíveis estão atrelados a obrigatoriedade do agricultor usar boa parte do dinheiro tomado para comprar agroquímicos. Como na agricultura natural não usamos agroquímicos temos que recorrer ao recurso próprio. Existem exceções, mas via de regra falta crédito e subsídio orientados para a produção agroecológica e orgânica.
2 - Uma vez vencidos o obstáculo financeiros vem o próximo: Know how.
Aqui em Coxim a Orgânic City teve o apoio imprescindível do SEBRAE (uma rara exceção) que subsidiou 70% dos custos de uma consultoria focada em plano de negócios e aperfeiçoamento das técnicas de cultivo. Graças a ela, e ao profissionalismo do professor Elio Kokehara, otimizamos o processo produtivo com relação a nutrição vegetal e ao equilíbrio de pragas e doenças, conseguindo melhores resultados na colheita. O mais importante, porém, foi conseguir dimensionar todos os custos da horta através do plano de negócios. Hoje sabemos exatamente qual deve ser o preço de venda para conseguir o lucro desejado. Calculamos tudo, incluindo depreciação de equipamentos, perdas e sazonalidades.
3 - Acesso à insumos de qualidade. Uma das dificuldades que ainda encontramos é a obtenção de esterco de qualidade (com procedência) e insumos como yoorin e ekosil, que tem que vir da capital. A necessidade de importar insumos aceitos pela legislação orgânica é um obstáculo pequeno, que por vezes até estimula a criatividade. Foi assim que conseguimos encontrar uma fonte de pó de rocha em nosso município. No entanto, firmar parcerias para obtenção deles, principalmente do esterco, é algo que precisa ser planejado com antecedência.
4 - Compreensão das demandas do mercado para tornar a oferta de produtos direcionada para um público alvo. Para a orgânic City este é o fator fundamental. É comum vermos no mundo dos negócios empreendedores que sonham com um produto, investem tudo nele, mas nunca perguntam a si mesmos: será que as pessoas querem compra-lo?
Não importa o quanto sua ideia seja boa e nobre. Se não houver demanda do consumidor ele não vai vender. E é exatamente neste ponto que gostaríamos de chegar: como o consumidor enxerga o produto orgânico e agroecológico? Porque é isso o que realmente interessa.
Se no momento da compra o consumidor não tem uma visão esclarecida do que é o produto orgânico e agroecológico, identificando nele a solução de um problema, ele não compra. Compara preços e, no que parece ser tudo igual, opta pelo mais fácil e mais barato.
A explicação para este fato é que, em essência, pessoas não compram produtos, vantagens nem sonhos. Pessoas compram resolução de problemas. Quer um exemplo claro? Quem compra uma moto esta resolvendo um problema de mobilidade. A cor da moto, marca, modelo e preço são decididos no processo da compra. Mas a determinação de comprar já havia sido estabelecida antes, no momento em que o consumidor decidiu que a moto resolveria seu problema de mobilidade. Quem compra um carro quer resolver o problema de falta de conforto em sua mobilidade. Quem compra uma casa precisa equacionar o problema de moradia e assim por diante.
A grosso modo, quem compra comida quer resolver o problema da sua fome. As pessoas precisam comer e desejam fazer isso com prazer, ou seja, querem comer coisas gostosas. Ocorre que no topo da lista dos alimentos mais vendidos tem tudo, menos verdura. Tirando de lado a minoria de japoneses e descendentes de europeus (comprovadamente consumidores regulares de horti-fruti), a maioria das pessoas comem verdura sem muito prazer. Isso é uma questão cultural e até mesmo genética, vide a escolha que uma criança faz frente a um prato de legumes e outro com batata frita e hambúrguer.
Se por uma questão cultural e genética as pessoas compram poucas verduras como tornar o produto mais atrativo criando demanda no mercado? O apelo de "livre de agroquímicos" não é suficiente para criar esta demanda. Mesmo o assunto sendo sério e muito importante a prática revela que, por enquanto, esta abordagem não foi suficiente para determinar uma compra mais seletiva. Talvez porque não tenha sido massificada nos veículos de comunicação talvez porque as pessoas não acreditem, de fato, que o veneno está na mesa.
Mas há outras estratégias que podem funcionar para fomentar esta demanda. Vamos apresentar agora quais foram utilizadas pela Orgânic City. Em nosso plano de negócios havia a necessidade de fazermos pesquisa de mercado, e através dela identificamos alguns "targets" simpatizantes e potencialmente compradores de nossos produtos:
a) Público fitness. Quem faz academia geralmente quer resolver o problema de não ficar feio. Quer tudo durinho, musculoso e bombadinho. Querem ficar bonitos. Há entre eles também os que desejam manter a saúde física.
b) Público que frequenta terapeutas, cirurgiões plásticos e nutricionistas. Eles querem resolver um problema de saúde e de estética também. Desejam perder gordura, estrias, pele em excesso e sanar problemas mais graves como anemia e disfunções de metabolismo.
Para o público "a e b" a publicidade da verdura orgânica e agroecológica deve ser orientada para a correta nutrição. É fato que a maioria das pessoas não sabe que uma verdura cultivada a partir de insumos orgânicos pode conter até 40 micro-nutrientes entre sais minerais e vitaminas. Na produção convencional, que usa NPK químico, o percentual de sais e minerais é menor. Esta é uma das razões pelas quais as pessoas comem e continuam sentindo fome: a comida oriunda da produção química não leva às células os nutrientes que elas precisam. Como as pessoas não sabem disso entram num círculo vicioso de comer várias vezes ao dia sem saber porque. Ter uma tabela nutricional que revele quais os nutrientes que uma verdura orgânica e agroecológica contém é um grande apelo de vendas para conquistar esse público.
Com relação a isso queremos destacar a iniciativa pioneira da cidade de Alcinópolis/MS. Lá, através de uma parceria com o poder público municipal, nutricionistas em postos de saúde prescrevem hortaliças como suplemento alimentar. De posse da "receita" os pacientes são encaminhados à horta municipal onde recebem verduras para o consumo da família.
Outra estratégia de Marketing utilizada para levar as vendas a patamares muito bons foi a utilização da técnica dos 4Ps na horta: Preço, ponto de venda, produto e promoção.
Com relação ao preço o plano de negócios definiu tudo, como havíamos citado anteriormente.
Ponto de venda é um quesito definido a muito tempo no meio de produtores orgânicos em todo o Brasil: Feira! A venda direta na feira é a forma mais lucrativa para o produtor orgânico e agroecológico. Deixar atravessadores intermediarem o negócio cria dois problemas: produto caro na gôndola do supermercado e lucro insuficiente para o produtor. Detalhe, a feira deve ser exclusivamente de produtores orgânicos e agroecológicos. De outra maneira gera tensão.
Na impossibilidade de vender na feira o delivery mostrou-se eficiente.
Produto: Na Orgânic City optamos por vender direto ao consumidor final através de cestas. Não comercializamos apenas um maço de verduras. Temos cestas compostas com um pouquinho de cada coisa. Isso agradou muito o público, estimulando-o a consumir um mix de verduras ao invés da tradicional salada de alface com tomates.
Promoção: Focado no seu público alvo, que além do "a e b" pode contar também com nichos onde se encontram uma parcela mais esclarecida da população, geralmente com formação de nível superior, a publicidade precisa destacar 3 fatores: Alto teor nutricional, mix e variação no modo de preparo e ausência de agroquímicos. Com relação a variação no modo de preparo é possível realizar pequenos vídeos e postar em redes sociais ensinando novas formas de preparar horti fruti. Na ausência de intimidade com internet fazer receitinhas e mandar para os clientes através de folhetos também funciona.
Bem, o assunto é extenso e há muito mais sobre o que falar. Chegamos até aqui com vontade de ajudar e com a certeza de que buscar uma alimentação saudável também é uma maneira de demonstrar respeito por este planeta.
Marcos Paulo Carlito Orgânic City Bioma Pantanal/Cerrado Novembro de 2020.
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